Só de loucos ou de quem muito amou!
Fui, talvez pela última vez, que as máquinas estão aí a chegar e vão certamente destruir muitos vestígios do passado visitar a Ponte de Pau. O lugar idílico de muitas recordações da minha juventude e de convívio com vizinhos e amigos. Foi com alguma dificuldade que partindo da Avenida de Salamanca, novo acesso a Santiago, me embrenhei pelo matagal, silvas, fetos e outras plantas bravias que substituiram as outroras bem cuidadas, quintas, quintais e hortas. Está quase tudo ao abandono, apenas vi um pequeno grupo de cabras, animais poucos exigentes, que me olharam de soslaio e que pareciam dizer: “Que anda este gajo a fazer por aqui?”
As cabras continuaram a ruminar e eu rumei à represa onde muitas vezes me banhei nos verões, já distantes, dos anos 60, do século passado.Da ponte de pau que deu o nome ao lugar, que já não conheci, só sobraram as pedras do portal, caídas no leito do rio e o pilar central, onde muitas vezes me sequei e apanhei sol. A represa que agora me parece muito pequena, estava completamente seca e o leito do rio cheio de bolotas e de urtigas. Enquanto caminhava fugiam assustados, dos amieiros e silvados, muitos pardais, pintassilgos e melros de bico amarelo. Lembro-me da represa cheia de outra vida: com água muito límpida, com espuma a saltitar nas pedras, com muitos rapazes, em cuecas ou em “pilau”, brincando e nadando, lavadeiras, peixes, cobras ribeirinhas fugidias e enguias escorregadias. Pensei descer o rio, até ao Poço do Nicolau, caminhando no seu leito, e assim o fiz, apesar de não levar roupa e calçado adequado. Nesta pequena viagem encontrei uma pequena colónia de tabuas, plantas aquáticas curiosas que terminam numa espécie de espiga castanha e cilindrica. A espiga é uma flor unissexual, feminina na parte inferior e masculina na superior. As folhas desta planta, compridas e esponjosas, servem depois de secas, para vedar as aduelas dos pipos, tonéis e selhas de madeira. Verifiquei que apesar da seca extrema, o curso de água não está totalmente seco. Existem vários locais com charcos de água e um pequeno troço, com alguns metros de extensão, com água. Por esse motivo e por não calçar botins de borracha, saí do rio e prossegui caminhando, com muita dificuldade, pela margem. Chegado ao Poço do Nicolau, outrora um local perigoso, confluência com a chamada Ribeira do Pintor, confirmei mais uma vez, que o “poço” está assoreado e que já não chega água vinda da Muna, do Catavejo ou de Travassós. A água existente no troço do rio, do Coval, passando pela Parede Nova e até à Ponte das Barcas é um enorme charco, escuro e malcheiroso, onde ainda sobrevivem carpas e pimpões. Caminhei até à estrada, junto à margem da ribeira, e admirei alguns plátanos que espero a fúria destruidora não venha a abater!
Também aproveitei para provar uma deliciosas uvas, do americano ou morangueiro, que crescem nas margens do rio Pavia e que estavam num estado de maturação que me pareceu perfeito. Um pouco mais à frente colhi umas amoras negras e deliciosas que me souberam maravilhosamente. Ainda sinto no palato o seu sabor e lembro o seu aroma inconfundível e maravilhoso. Os arranhões e os incómodos ficaram esquecidos e um banho, desinfectante e um pouco de eosina, tudo resolvem.
Ribeirinho, Amigo de Viriato